Monday 27 April 2009

Vivemos em tempos mais comedidos

«Sinto que estou mais consciente sobre as questões sociais contemporâneas.»

As suas peças exploram conceitos de memória, tradição e identidade, João Pedro Vale explora a força da arte para se aproximar da cultura popular de uma comunidade imaginária. A nível do mercado, Pedro Vale concebe as suas obras de acordo com três plataformas: «Existem os projectos desenvolvidos a nível pessoal para exposições, e depois são comercializados pelas galerias; existe o trabalho para a galeria – pois vou fazer uma exposição na galeria, por exemplo; e existem as feiras – ou é uma peça em armazém, ou vem no decorrer de uma vontade em conceber uma peças que vai ser inserida no circuito comercial através de um evento que dura três ou quatro dias»

Apesar de nos encontrarmos numa fase de depressão no ciclo económico, «continuo a fazer o mesmo, não sinto que estou a abdicar de nada por uma questão de mercado, mas sinto que estou mais consciente sobre as questões sociais contemporâneas, quer na produção das peças, independentemente de esta ser concebida intencionalmente para o mercado ou não, quer a nível pessoal», afirma o artista. Cada uma das peças concebidas por Pedro Vale surge no mercado com o seu mérito próprio.

Para João Pedro Vale, quem compra as suas peças está à procura de um valor (do valor intrínseco da obra de arte por oposição ao da peça como forma de investimento), por isso, «talvez as coisas me tenham corrido bem por causa da minha capacidade em diversificar as hipóteses de escolha para quem procura e compra». Também «existiu uma progressão muito tranquila do valor da minha obra, não houve uma grande oscilação dos preços, razão por que não sinto a falta de procura».

E por todo o lado, «não há grande diferença em relação aos dois anos anteriores, pois as galerias continuam a ter a mesma actividade, mas talvez de uma forma mais consciente. Hoje continuo a ter a mesma cadência de solicitações de peças».

Isto apesar de nos últimos meses haver a crescente percepção de que “há galerias a fechar, os artistas estão a mudar de ateliers e a reduzir o número de assistentes». Este facto «tem que ver com a forma como as pessoas estão a viver», são tempos mais comedidos, de menor ostentação social nos usos e costumes representativos da actividade económica de cada indivíduo, adianta o artista. Ou seja, o acto de comparação social está no desejo de as pessoas actualmente serem identificadas como mais prudentes, responsáveis, discretas. Por exemplo, um dos efeitos foi a Yvon Lambert, com espaços abertos em Paris e Nova Iorque, ter fechado o espaço expositivo na Hoxton Square (Londres), em Março passado, seis meses depois de ter aberto, com a apresentação ao público de uma única exposição.

Actualmente, muitos dos potenciais coleccionadores institucionais, os que normalmente compram as peças de maior dimensão, têm uma atitude de «esperar para ver», «talvez exista uma maior cautela por parte das grandes instituições em adquirir peças; enquanto o coleccionador privado é um coleccionador que continua a procurar e a comprar novas peças para o seu espaço».

A arte sempre foi um produto representativo das necessidades culturais. O boom no mercado de arte sempre acompanhou o boom económico. Foi assim no renascimento, foi assim na última década. Actualmente, os galeristas (como intermediários) sabem que os artistas empurrados para o mercado durante os últimos três ou quatro anos já não têm procura.

Published at NS'172/IN#068, Mercado da Arte (70), (Diário de Notícias N.º 51154 e Jornal de Notícias N.º 329/121), 25 de Abril de 2009, Portugal. João Pedro Vale, Diabrete (Ferro, tecido, papier-maché e chocalhos, 325,120,100cm), 2008. Courtesy o Artista.

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