Monday 29 June 2009

Veneza diversifica o turismo cultural

O sector criativo está a ser a força fundamental para a substituição dos serviços financieros.

Nas últimas décadas, uma nova divisão do trabalho está a emergir a nível global. Uma divisão não construída sobre o produto mas sobre processos relacionais. Enquanto a manufactura está influentemente a derivar para as economias emergentes, na América do Sul ou no Sudoeste Asiático, e os serviços estão a deslocar-se para localizações mais provinciais, ou menos urbanas, o que permanece, o que cresce nos grandes centros é o privilégio de acesso a informação esotérica.

Neste contexto, o sector criativo (as artes, o entretenimento cultural, os serviços educativos e de saúde, e o turismo) está a provar ser a força fundamental para a substituição dos serviços financeiros. Da mesma forma que estes serviços, também as actividades criativas dependem das interacções, das redes, de rumores, dos encontros e desencontros individuais que só podem ser encontrados nos locais e espaços anteriormente ocupados pelos bancos. A base para esta performatividade está, crescentemente, organizada sobre o que se é ou acredita ser, como significado, ou invés de se considerar o que se faz.

Alternadamente entre artes plásticas, arquitectura, cinema ou teatro, Veneza diversifica a oferta de serviços num dos sectores que movimenta mais capitais e fluxos de pessoas a nível global: o turismo cultural. A 53ª edição da Bienal de Veneza, intitulada de Fazer Mundos, decorre até 22 de Novembro de 2009, e assimila a apresentação de 90 artistas oriundos de todo o mundo (John Baldessari, Dominique Gonzalez-Foerster, Koo Jeong A., Renata Lucas, Cildo Meireles, Aleksandra Mir, Yoko Ono, Lygia Pape, Michelangelo Pistoletto, Marjetica Potrc, Rirkrit Tiravanija, Héctor Zamora, entre outros). A aposta no turismo cultural, em 2007, atraiu cerca de 319 mil pessoas aos dois espaços da 52ª da Bienal de Veneza, enquanto os 42 pavilhões nacionais e os 34 eventos colaterais espalhados pela cidade receberam a visita de 827 mil e 650 mil pessoas, respectivamente.

Com ênfase no processo criativo, as obras de arte seleccionadas pelo curador convidado para a 53ª edição da bienal, Daniel Birnbaum (1963, Estocolmo, Suécia), representam uma visão do mundo e apresentam-se como uma forma de fazer um mundo. Ao tomar este «fazer mundos» como ponto de partida, a exposição internacional de arte permite fomentar a criatividade em futuras gerações, explorar espaços exteriores ao contexto institucional e existir para além das expectativas do mercado da arte.

Este ano as representações nacionais apresentadas nos pavilhões históricos dos Giardini, em áreas seleccionadas do Arsenale e em múltiplos espaços na cidade de Veneza, compreendem 77 nações convidadas, como Luiz Braga e Delson Uchôa (Brasil), Liam Gillick (Alemanha), Steve McQueen (Reino Unido), Lucas Samaras (Grécia), Teresa Margolles (México), Miquel Barceló (Espanha), Bruce Nauman (EUA). Entretanto, estão propostos por várias instituições e organizações internacionais 44 eventos colaterais, paralelamente ao evento principal e de maior atenção mediática.

Situada na margem do Grande Canal, na Fondaco dell’Arte, o pavilhão da representação oficial de Portugal apresenta uma instalação concebida pela dupla João Maria Gusmão + Pedro Paiva, comissariada por Naxto Checa (director do espaço Zé dos Bois, em Lisboa).

Depois de anos de representações dedicadas a introspecções estéticas, o pavilhão Português apresenta a exuberância do trabalho das novas gerações de artistas nacionais. Para esta bienal, a jovem dupla de artistas apresenta uma instalação em suporte fílmico (16 filmes mudos de 16mm e 35mm, concebidos entre 2007 e 2009, dos quais alguns já foram anteriormente apresentados ao público) influenciado entre a fenomenologia, a antropologia e a metafísica pré-socrática. Ventriloquismo (2009) ou Meteorítica (2008) são algumas das possibilidades apresentadas.

Experiências e Observações em Diferentes Tipos de Arte, é o titulo da exposição e apropria-se do título de um ensaio cientifico de Joseph Priestley, teólogo e filósofo naturalista do século XVIII. As observações apresentadas a público estão enquadradas nas explorações e experiências realizadas pelos artistas, sobre os fenómenos singulares do universo da ciência, como possibilidade abertas para o conhecimento do mundo e de, outra forma, deslegitimar o que foi institucionalmente estabelecido pelas veleidades da contemporaneidade.

Published at NS'181/IN#077, Mercado da arte (70), (Diário de Notícias N.º 51217 e Jornal de Notícias N.º 26/122), 27 de Junho de 2009 Portugal © Lygia Pape, TTEIA 1, C (2002), 2005 Courtesy: Project Lygia Pape - Cultural Association (Foto: Paula Pape); João Maria Gusmão + Pedro Paiva, A Tábua Humana, 2009 Courtesy: Direcção-Geral das Artes (Lisboa) e Centro Cultural Inhotim (Minas Gerais, Brasil)

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