Monday, 25 January 2010

As grandes obras

A ambição devia estar para com a programação artística e cultura, não para com os edifício.

Num período de grande apoio financeiro a Portugal por parte da União Europeia, obras como o Centro Cultural de Belém (construído durante o governo de Cavaco Silva) ou o projecto do Museu de Arte e Arqueologia do Vale do Côa (durante o governo de António Guterres) foram consideradas uma forma de atrair desenvolvimento económico e turístico. Agora, em tempos de contracção económica. Os projectos ambiciosos (por exemplo, a construção do novo aeroporto, do comboio de alta velocidade ou do novo museu para os coches) visando a perpetuação do nome na história começam a fazer pouco sentido.

Um dos argumentos para isso é que, nos últimos cinco anos, administradores e directores das diversas instituições públicas sucumbiram à exuberância irracional de rivalizar com o universo bancário e com o frenesim da construção (veja-se o caso da ilha artificial, com forma de palmeira, construída no Dubai, que agora não encontra compradores).

Depois de anos de entusiasmo bolsista, em 2008 a sociedade civil percebeu-se do vazio financeiro em que se encontrava esse mercado. Com as consequências que se tornaram visíveis em Setembro daquele ano e ainda sentidas no nosso dia-a-dia, pois a crise está a expor a fragilidade social economicamente sobrecarregada e a má gestão e planificação dos recursos e da riqueza existente.

Os edifícios ou as construções com alguma importância custam dinheiro para serem mantidos e com o tempo deterioram-se. Estas edificações em si tornam-se em custos públicos.

Como no quotidiano social, nas artes também as grandes obras desencarnam o conteúdo enquanto perpetuam a existência de um corpo morto-vivo, de um espaço que existe sem funcionamento interno. A nível global, muitos profissionais da arte descrevem os seus edifícios como casos de necessidade: de aumentar o espaço expositivo para poder expor as obras em acervo; precisam de espaços de lazer agradáveis para receber os visitantes; necessitam de um edifício que esteja de acordo com a presentes normas. A ambição devia de estar para com a programação, não para com o edifício.

Que o digam os museus nacionais, quase todos com dificuldades de funcionamento, reduzidos recursos financeiros e ausência de uma boa gestão económica e de recursos humanos. São inúmeros os exemplos: o Museu de Évora, o Museu Nacional de Arte Contemporânea (Museu do Chiado), o Museu de Arte Popular, o Museu Nacional de Etnologia ou o Museu Nacional da Arte Antiga.

Published at NS'211/IN#107, Mercado da Arte (62), (Diário de Notícias N.º 51427 e Jornal de Notícias N.º 236/122), 23 de Janeiro de 2010. Portugal Fachada do Museu do Chiado. Courtesy Museu Nacional de Arte Contemporânea - Museu do Chiado

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