Timothy Taylor Gallery
Affinities
Diane Arbus
A fotografia de Diana Arbus (Nova Iorque, 1923-1971), Clouds on-screen at a drive-in movie, N. J. (1960), momentaneamente, reporta-me para a disputa entre dois dos considerados melhores pintores da Grécia Antiga, Zeuxippos e Parrhasius. As nuvens projectadas no ecrã do cinema ao ar livre assemelham-se mais com o vasto corpo de possibilidades de representação da ideia de nuvens do que as nuvens que na realidade envolvem o ecrã do drive-in – mais parecidas a corpos amorfos. Enquanto, por um lado, os animais ao realizarem que uma imagem é uma reprodução da realidade, e não a realidade, perdem o interesse por essa imagem; por outro, nos seres humanos, apesar de continuarmos a ser animais, acontece precisamente o oposto. O nosso interesse pela imagem é ainda maior quando percebemos que é uma imagem! Este estranho dualismo na imagem de Diana Arbus transgride as fronteiras tradicionais entre a realidade e o falso, mas ela (Arbus), fá-lo de uma forma particular através do recurso ao retrato.
A procura por um humanismo nas poses frontais de indivíduos, incógnitos, parte e complemento do ambiente social de Nova Iorque, entre as década de cinquenta e setenta, informa-nos de uma forma desconcertante e detalhada sobre as diferentes subculturas que tende a representar. “Em qualquer acto criativo existe também um acto de resistência” (Deleuze), e no caso de Diana Arbus este acto de resistência tomou a mesma forma que tomou com Robert Frank. A insatisfação e o descontentamento com que ambos encaram as diferenças culturais e sociais Norte-Americanas foram ironicamente traduzidas através da forma como captaram o sujeito fotografado; e na documentação das tenções existentes entre realidades raciais, cultural e sociais distintas.
Uma das funções específicas de uma imagem é o seu caracter eminentemente histórico. A importância histórica e messiânica das imagens resulta na forma como projectam poder e a possibilidade direccionada para o que é por definição impossível, um regresso ao passado. A experiência histórica resultante da 'dialéctica das imagens' é messiânica com dois sentidos: é escatológica, de espera ansiosamente por algo, por um lado, e de salvação, por outro. As imagem revelam-se em si mesmas ao invés de desaparecerem no que fazem visível. Em cada momento, cada fotografia é carregada por um momento histórico sobre as forças destrutivas do capitalismo e da conformidade social definidoras da sociedade Norte-Americana da década de cinquenta.
Arte ou Documentação? As fotografias de Diana Arbus funcionam como uma resposta visual às pressões da transformação social ocorridas durante a década de sessenta. Durante este período uma nova cultural emergiu e estruturou a realidade com que lidamos presentemente: entre o gradual confronto com as limitações do meio que é específico da arte (o formalismo Greenbergiano), e de tudo que possa existir no processo de reconhecimento da mesma (a sublevação Duchampiana) da distinção entre a arte e a vida, e o desenvolvimento de um novo conjunto de regras criativas para serem aplicadas numa situação histórica diametralmente nova. Sem o retorno ao passado. No entanto, o que aconteceu foi mais no sentido da sofisticação do vocabulário conceptual, usado para analisar as condições e os efeitos dessa transgressão à hegemonia optimista imposta pela disciplina social, cultural e política do pós-Segunda Grande Guerra.
Crescentemente a experiência sensorial é obtida através do confronto com a imagem. As fotografias de Diana Arbus reflectem um maior interesse no observador do que no fotógrafo ou no assunto. Ao fotografar o 'circo' e aqueles que se encontravam à margem dos cânones sociais (os 'freaks'), ela faz com que exista no contacto com quem observa as imagens. Um momento de embaraço derivado do olhar directo com que cada uma das personagem fotografada nos olha e nos atraí para o seu meio. Imagens como Russian midget friends in a living room on 100th Street., N.Y.C. (1963) ou Two girls in identical raincoats, Central Park, N.Y.C. (1969) transportam-nos para um mundo povoado por transgressões físicas ou para o homogéneo meio dos arquétipos da individualidade social. Comportamentos comprometedores da salutar convivência social. No entanto, o acto de sublevação é, ainda mais, reforçado quando se enriquece o corpo de imagens observadas com A blind couple in their bedroom, Queens, N.Y. (1967) ou, realizadas quando da sua visita a Londres, Wax Museum: Lord Snowdon and Princess Margaret, London. England (1969), nas quais o olhar dos sujeitos fotografados é desabitado. Encontramo-nos, como observadores, numa zona de indecisão entre o real e o possível.
A exposição Affinities, de Diana Arbus, patente na Timothy Taylor Gallery até 17 de Agosto de 2012, reúne um conjunto trinta e duas fotografias concebidas no decorrer da sua carreira (1956-71). A fotógrafa explora a noção de afinidades – os elementos que compartilhamos, como aqueles que não compartilharmos.
Imagens: Courtesy of Timothy Taylor Gallery.
Published at Molduras: as artes plásticas na antena 2: Diana Arbus.
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